TIA CIATA



O documentário Tia Ciata, de Mariana Campos e Raquel Beatriz, aborda a importância política de Hilária Batista de Almeida (1854-1924), mais conhecida como Tia Ciata, para o protagonismo feminino negro e a história cultural do Brasil.
Numa época em que o país vivia a pós-abolição e o advento da República, a perseguição aos negros se intensificou com o fim formal da escravidão. Como resultado da diáspora baiana para o Rio de Janeiro, Tia Ciata chega à cidade e ajuda a construir o que se chamou de “A pequena África”, uma rede de acolhimento de ex-escravos que se estendia do Cais do Porto até a Cidade Nova, tendo como núcleo central a Praça Onze. Essas comunidades eram organizadas pelas rainhas negras, chamadas de “Tias”, que exerciam liderança religiosa e eram responsáveis pelas frentes de trabalho, tornando-se esteios de uma nova geração.
Considerada uma grande agitadora cultural, Tia Ciata conquistou o respeito de políticos e integrantes da alta sociedade carioca, reunindo em sua casa, empresários da noite, músicos e compositores, num espaço que seria o berço do samba. Suas festas misturavam música, capoeira, jongo e candomblé, enfrentando as autoridades policiais, num tempo em que essas manifestações culturais e religiosas eram proibidas, sendo consideradas como vandalismo e vadiagem.
O documentário resgata essa história, que foi ocultada pela ensino formal durante décadas, através da memória, e questiona a ideia de nação brasileira enquanto o elemento povo é concebido numa visão europeizada e excludente de negros, índios e mestiços. Também discute identidade e racismo a partir da falsa noção de harmonia racial, construída no imaginário popular pela elite que governa o país. Com depoimentos de pesquisadoras e representantes da cultura afro-brasileira, o filme traz uma importante reflexão sobre a luta do povo negro, sua resistência e força criativa, mostrando não somente o protagonismo e herança de Tia Ciata, mas o direito da mulher negra à visibilidade, como sujeito da história, em toda sua força e fragilidade.

O curta metragem conta com a participação de: Helena Theodoro, filósofa e pesquisadora da Cultura Afro-brasileira; Conceição Evaristo, escritora e doutora em literatura comparada; Angela Peres, antropóloga e atriz; as cantoras Nina Rosa e Marina Íris; Giovana Xavier, historiadora, professora da UFRJ e coordenadora do grupo Intelectuais Negras; Janaína Oliveira, pesquisadora e coordenadora do FICINE (Fórum Itinerante de Cinema Negro); Gracy Mary Moreira, bisneta de Tia Ciata; e Mãe Beata de Iyemonjá.

Elisabete Estumano Freire

* Texto publicado no Festival de Cinema Feminino de Chapada dos Guimarães
http://tudosobremulheres.art.br/criticas-elviras/
Similar Videos

0 comentários: